Espelho, Espelho Meu

Lily Collins dá vida a Branca de Neve em Espelho, Espelho Meu.
Em tempos de cinismo e descrença generalizada, parece que os contos de fadas estão fadados à descrença. Não é incomum ver narizes torcidos diante de iniciativas como estas do indiano Tarsem Singh de render-se aos apelos irresistíveis dos sonhos e da inocência de um belo conto sobre uma princesa encantada. Talvez o desejo de ver Espelho, Espelho Meu sagrar-se como uma grande obra seja maior do que o bom senso, mas a adaptação, que tem inúmeros percalços, garante a linearidade e o frescor em boa parte de sua narrativa, um frescor que, ironicamente, vem  de seu irresistível apelo aos antigos padrões estabelecidos em uma narrativa como esta. O grande equívoco do filme é desejar a ruptura dos contos de fadas quando seus melhores momentos estão justamente na manutenção da aura de ingenuidade típica dessas histórias que sobrevivem por gerações.

A plot de Espelho, Espelho Meu não é novidade para ninguém. Branca de Neve se vê orfã e sob os domínios da Rainha Má, sua perversa madrasta que a mantém prisioneira no castelo. Quando a vilã dá ordens para dar fim na vida da enteada, Branca de Neve conta com a piedade de seu algoz e acaba escapando do seu cruel destino. A princesa acaba sendo acolhida por um grupo de sete anões, que acabam se tornando seus grandes amigos e aliados. Esta trama inicial que nos é contada há anos sofre livres adaptações dos roteiristas, algumas bem-vindas outras não. O que mais incomoda em Espelho, Espelho Meu é sua evidente indecisão pelo tom que deve dar à sua narrativa. A impressão que dá é que o filme de Tarsem Singh vive na eterna encruzilhada: devo me render ao conto de fadas ou tentar subvertê-lo. O que é uma pena pois está mais que claro que Espelho, Espelho Meu brilha quando se rende à magia e ao romantismo e perde consideravelmente quando tenta realizar algumas modificações tolas na clássica história da Branca de Neve.

Nesse eterno impasse do filme, Julia Roberts se sai deliciosamente bem. Perversa e entregue à completa diversão, a atriz parece ter sido feita para interpretar a Rainha Má, uma personagem que não esconde a simplicidade de seus propósitos: destruir sua rival a qualquer custo. Roberts entrega-se ao espírito da obra e faz uma vilã que, para nosso deleite, oscila entre a loucura e o humor, o que é ótimo pois a atriz tem um inegável timing para a comédia e aqui o aplica muito bem. O mesmo pode ser dito de Armie Hammer, o príncipe, e Nathan Lane, o mordomo da Rainha, ótimos em suas parcerias com a estrela. No entanto, Lily Collins é visivelmente prejudicada pela inconstância do roteiro, já que sua Branca de Neve é alvo das mudanças do teor da narrativa do filme. O que não dá para negar é que Collins está magnética, linda, fisicamente ela é a Branca de Neve.

 
Espelho, Espelho Meu sofre do mesmo mal que toda a filmografia do indiano Tarsem Singh. É perfeitamente compreensível que o diretor queira imprimir suas marcas em sua carreira. No entanto, é preciso compreender como inserí-las em cada um dos contextos que lhes são propostos. Sendo seu trabalho mais regular, Espelho, Espelho Meu seria mais interessante caso se jogasse no universo repleto de possibilidades de um doce e mágico conto de fadas. O teor subversivo que Singh tenta impor a seu filme é redundante e não apresenta nenhuma subversão. Ainda assim, o filme merece créditos por tentar colocar um pouco de inocência e simplicidade narrativa na cada vez mais cínica e realista Hollywood. Bons e divertidos sonhos! 

 


Mirror Mirror, 2012. Dir.: Tarsem Singh. Roteiro: Melisa Wallack e Jason Keller. Elenco: Lily Collins, Julia Roberts, Armie Hammer, Nathan Lane, Jordan Prentice, Mark Povinelli, Joe Gnoffo, Danny Woodburn, Sebastian Saraceno, Martin Klebba, Ronald Lee Clark, Mare Winningham. 106 min. Imagem Filmes.

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Chovendo Sapos: Espelho, Espelho Meu
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